quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Como Transformar os Desejos do Consumidor em Vendas

Você sabe o que faz um indivíduo ficar na lista de espera para se hospedar em um hotel ao ar livre? Provavelmente, o mesmo motivo que leva milhares de pessoas a comprar algo de dez dólares em um site na internet e só descobrir o que vem dentro da caixinha quando recebe o produto em casa. É o desejo de algo que não existe, mas que desejo é esse?

Chama-se SomethingStore, uma loja virtual em que você compra alguma coisa por $10 (no Brasil, é preciso acrescentar o frete) e recebe algo aleatório. A empresa despacha de tudo: desde ampulhetas, pantufas, carrinho de controle remoto até iPod Shuffle, com exceção de armas, drogas, bebidas, partes ou fluídos corporais. Também tenta agradar a todos os pedidos e declara que sabe que alguns produtos são de maior valor material que outros, mas aposta mesmo é no valor sentimental que ele terá para quem recebe.

Em um contexto de mudanças constantes nas organizações, muitas vezes é difícil para o empresário reorganizar sua instituição e mudar seu foco para se adaptar ao novo conceito de mercado. Se ontem comprávamos ações da única companhia telefônica, hoje trocamos de celular todos os anos e ainda podemos escolher a empresa que nos atenderá. Por isso, precisamos estar aptos e sensíveis para perceber, analisar e adaptar as mudanças ao nosso cotidiano e planejamento.

Recentemente, tive a oportunidade de assistir a uma palestra de Beth Furtado, diretora de planejamento da QG Propaganda, empresa do Grupo Talent, e autora de alguns livros, em que pude confirmar o quanto as decisões dos consumidores são complexas e ambivalentes, sendo muitas vezes tomadas a partir de desejos. “A busca da sensação supera a posse do bem. A obsolescência acontece no ato da compra”, afirmou Beth.

O que ela quis dizer com isso? Que hoje vivemos uma realidade de paradoxos. Abandonamos o casulo e buscamos a conexão. “De um lado, os descontos explodem e, do outro, vemos pessoas pedindo dinheiro emprestado para comprar o celular do momento”, afirmou – colocando em debate a extinção da classe média e o nascimento da low cost (baixo custo). A palestrante dividiu os desejos ou buscas contemporâneos em oito, mostrando como foram decodificados por algumas empresas inovadoras sob a forma de serviços, produtos, projetos ou conceitos.

Palestra proferida no Seminário Marketing 306º, realizado em São Paulo, nos dias 15 e 16 de outubro de 2008.

Beth Furtado, diretora de planejamento da QG Propaganda, empresa do Grupo Talent, e autora dos livros: Singularidades no Varejo, Almanaque QG insights: horizontes de consumo e Desejos contemporâneos. Indicada ao Prêmio Caboré 2008 na categoria Profissional de Planejamento.

1. Originalidade – Uma pesquisa realizada pelo Núcleo Jovem da Editora Abril apontou o consumo da expectativa como uma das dez fortes tendências contemporâneas. Beth afirma que sempre desejamos algo que não temos e, quando conseguimos, não o queremos por muito tempo. Vivemos a era do efêmero, em que a sensação é proporcionada pela transitoriedade. Então, como seu produto ou negócio se insere nesses tempos de desejos transitórios?

Na Alemanha, a loja Lüette Leihen aluga kits de roupas de bebê por uma taxa mensal que varia entre 17 e 26 euros. Quando o neném cresce, a empresa disponibiliza um kit de tamanho maior, que inclui todas as peças necessárias para essa fase. Nesse período, em função do crescimento, a perda de roupas, calçados, etc. é muito rápida. Por isso, peças praticamente novas são descartadas ou guardadas para os próximos filhos.

2. Juventude – Desejo de estar aonde a vida acontece. Beth afirma que, atualmente, criar negócios para jovens é uma oportunidade, porém elaborar ações para que as pessoas se sintam jovens é a receita do sucesso. Como exemplo, ela mostrou os shows do Cirque Du Soleil e a criação, em tempo real, de produtos Nike nos grandes painéis das avenidas de Nova Iorque – todos conceitos que trafegam em avenidas de alta velocidade emocional. Não importa sua idade, o fato é que viver a vida com intensidade é um anseio dos jovens.

3. Velocidade – As demandas profissionais não cabem em nossa semana nem sonhos em nossos bolsos. De acordo com a palestrante, a resposta para todas essas impossibilidades é velocidade, pois com ela a percepção de tempo diminui. Equipamentos e displays de lojas adquiriram rodas e tornaram-se mais leves e versáteis.

O varejo tornou-se mais dinâmico e efervescente. Além disso, os ciclos de vida dos produtos ficaram menores e os produtos sazonais com prazo de vendas temporárias viraram febre. No Brasil, quem faz uso dessa tendência é a Chilli Beans (já nasceu sem vitrine) e as novas lojas O Boticário. Beth alerta que com a retirada da vitrine, a importância da atitude das pessoas aumenta. Fica aqui o alerta para os vendedores!

4. Inclusão – Desejo de fazer a diferença. Beth explica que essa inclusão significa, acima de tudo, reconhecer que todas as pessoas são importantes: uma diferente da outra, mas todos merecedores e com poder de compra. A Asda, operação inglesa integrante do Wal-Mart criou cartões para casais gays, integrando-se à legislação inglesa de casamentos entre pessoas do mesmo sexo.

Para envolver as crianças no hábito da leitura, a livraria Kids Republic, na China, criou um espaço lúdico, multicolorido e cheio de fantasia em todos os aspectos. A palestrante lembra que na indústria cosmética brasileira, por exemplo, até pouco tempo não havia produtos específicos para peles negras.

5. Descontinuidade – Para Beth, no âmago da despadronização, encontra-se um desejo singelo: ser surpreendido. Afinal, nada mais arrebatador que encontrar o inusitado, o que reflete que somos únicos. Como exemplo, ela mostra o lançamento da Odebrecht: o Vale dos Cristais (nas proximidades de Belo Horizonte, MG), que ocorreu há alguns anos. Na Vila Gardner, são oferecidas em um mesmo prédio plantas de apartamentos dúplex, outras em um mesmo piso com três quartos ou sem quartos e tudo vira um loft. “Há algum tempo, um produto versátil e mutante era uma oportunidade. Hoje, é regra do jogo”, afirma.

Em Copenhague, Dinamarca, o Hotel Fox propõe a quebra de monotonia em hospitalidade ao oferecer 61 quartos absolutamente distintos entre si. Segundo os idealizadores, já que as pessoas são diferentes e querem ser tratadas de forma única, a idéia é permitir que vivenciem novas experiências a cada hospedagem.

6. Inspiração – Desejo de ser arrebatado. Como não existe emoção sem sentidos, inspirar pessoas é arrebatá-las por meio de músicas, sons, fragrâncias, sabores e contato. Segundo a palestrante, de todos os sentidos, o olfato e a audição ocupam lugar de honra no resgate de memórias. Por isso, traz como exemplo a varejista Ikea, empresa sueca de móveis e decoração, que criou, em julho de 2007, uma ação experimental numa de suas lojas em Oslo, na Noruega.

Durante quatro noites, os clientes foram convidados a dormir em ambientes especiais montados na loja. Os espaços contemplavam suíte de núpcias, luxo e familiar. O programa incluía café-da-manhã, roupões, chinelos e um tour pela loja fechada. Os clientes, além da experiência, que será lembrada durante toda a vida, ainda levaram de brinde os lençóis utilizados durante a noite. Fica a pergunta: sua empresa possui alguma iniciativa que faça seus consumidores perderem o fôlego?

7. Conexão – Desejo de aconchego. Beth afirma que precisamos resgatar ternura, simpatia, empatia e compaixão por dois motivos. Primeiro, porque isso nos torna melhores profissionais e marcas, além de nos deixar mais antenados com a epidemia de carência afetiva de nossa época. Portanto, mais eficientes em nossa resposta ao meio e ao que os consumidores nos pedem. Segundo, pelo fato de sermos humanos e esquecermos as características que nos definem como tal. “Sensibilidade é, portanto, um ativo e uma inspiração para estabelecer conexões e entregar o aconchego que tantas pessoas anseiam”.

E como fazer isso? Em São Paulo, no empreendimento Villagio Panamby, da construtora Gafisa, existem prédios em que o térreo apresenta um espaço individual para cada apartamento, que é destinado para a montagem de um escritório residencial fora do ambiente doméstico. Com isso, as pessoas que trabalham em casa podem receber visitas profissionais sem afetar a rotina doméstica. Nos Estados Unidos, a Air Troductions tem como objetivo aproximar pessoas que viajam com freqüência em companhias aéreas. O interessado posta seu perfil e destino e, quando há outro viajante com desejos comuns nos mesmos vôos, são alertados por e-mails para que possam fazer contato no aeroporto ou durante o vôo.

8. Perspectivas – Desejo de esperança. Beth enfatiza que pessoas querem esperança, perspectivas, segurança e serenidade. Desejos que, segundo ela, podem ser transformados em produtos, em comunicação, na promessa e na entrega dos mais variados setores. “É um profundo desejo humano à espera de empresas que o atendam”, afirma. No Wal-Mart Brasil, todas as sacolas das mais de 300 lojas são produzidas com material reprocessado, com 30% de material reaproveitado.

A empresa pretende ir além e disponibilizar sacolas biodegradáveis que se decompõem em apenas três anos. Reaproveitar, reutilizar, recriar e reinterpretar. Para a palestrante, o “re” é o prefixo do século. “Faça sua parte: coloque ‘re’ alguma coisa no seu plano de ação”, finaliza.

É preciso avaliar onde estamos hoje, quem queremos ser amanhã e o que vamos fazer para chegar lá. O ideal é encarar as mudanças como um ativo natural de crescimento. Abra a mente e esteja receptivo às mudanças que considere fundamentadas para a natureza do seu negócio. Lembre-se de que o mundo muda o tempo todo e os desejos dos clientes também. Você vai ficar aí parado, olhando?

O hábito de pensar no futuro

John Mahaffie, antropólogo e autor do livro 2025: Scenarios of us and global society reshaped by science and technology, ensina que desenhar o futuro, literalmente, é uma ótima forma de iniciar um debate sobre ele, pelo fato de resumir, em uma única imagem, o cenário previsto. Também ressalta que esse exercício, o qual ele chama de “hábito de pensar no futuro”, exige pessoas diferentes entre si, pouco comuns – alguns até diriam “estranhas” – e com habilidades diversas. Em poucas palavras, indivíduos com idéias próprias sobre mudança e abertos às idéias alheias.

Mahaffie afirma que a invenção do futuro não pode se restringir, de modo algum, aos profissionais da empresa: “Se pretende liderar o futuro, é preciso esquecer as portas fechadas. O processo deve incluir todos os clientes, porque, além de saberem muitas coisas que a própria organização desconhece, eles formam um público que deve estar preparado para compartilhar idéias comprometedoras, provocativas e inquietantes. Os fornecedores, de igual maneira, devem ser convocados, ou seja, a empresa que lidera mudanças não fica nem na vanguarda do mercado nem na ‘rabeira’. Ela se une ao mercado para estudar os passos de sua metamorfose”.

Por Alessandra Assad

Agradecimento especial: Bruno Mello, editor-executivo do portal Mundo do Marketing.
Visite o site: www.mundodomarketing.com.br

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